Semear limites e colher o quê?

Limites, parece que há consenso sobre essa palavra quando o assunto é educação infantil. No recomendado blog Mamíferas encontrei a reflexão abaixo e gostei muito da interrogação deixada. Compartilho.
  
JP, deliciosamente fotografado pela mãe num momento peraltice


Por: Tata - Blog Mamíferas

"Outro dia, presenciei uma discussão sobre criação de filhos. A conversa girava em torno de três conceitos básicos: disciplina, limites e frustrações. Entre os envolvidos, um quase consenso: pais e mães não podem querer evitar frustrações – é preciso colocar limites para as crianças, o tempo todo. Estranhei, e explico porque.

Frustrações fazem parte da vida, e ponto. Ninguém em sã consciência negaria essa afirmação. Tropeços, desilusões, chateações, decepções, são coisas que fazem parte da vida de todos – bebês, crianças, adolescentes, adultos, idosos. Frustrar-se e entristecer aqui e ali porque as coisas não saíram do jeitinho que se gostaria é quase como respirar, quase como comer, dormir: impossível passar sem.

As frustrações acontecem todos os dias na vida de nossos filhos, sem que nós possamos fazer nada a respeito: são bloquinhos de madeira que insistem em não parar equilibrados uns em cima dos outros, são degraus grandes demais para o tamanho das perninhas aprendizes, são coisas perigosas e que parecem super interessantes mas não permitem investigação, são dias de chuva em que o quintal parece mais atraente do que nunca e ainda assim inacessível – são milhares de pequenas-grandes coisinhas (e outras grandes-grandes também) que diariamente vão ensinando de um jeito natural a nossos filhos essa grande verdade da vida: que as coisas são do jeito que são.

Às vezes como queríamos que fossem, às vezes podemos mudá-las, e outras vezes simplesmente elas são como são e precisamos aprender a conviver com elas.
Costumo torcer o nariz quando ouço alguém usar o termo “colocar limites” para falar de como educar uma criança. Limite, para mim, não é coisa que se coloca, que se ‘fabrica’  – e por isso essa expressão ‘colocar limites’ me parece mecânica, forçada. Os limites vão acontecendo, vão surgindo, vão se delineando e se transformando todos os dias.

Eu não preciso ‘colocá-los’ diante de minhas filhas – nós os percebemos juntas. E todos os dias, aprendemos que aquele limite que ontem era tão absoluto, hoje já afrouxou um pouco. E aquele outro que nem existia, agora está aqui bem diante de nossos olhos. E outros ainda parecem tão firmes que talvez estejam lá até o fim de nossos dias – e talvez não. A vida é assim, dinâmica. Nosso olhar sobre ela também deveria ser.

E assim como as frustrações fazem parte da vida, e os limites acontecem naturalmente, são legítimos e perfeitamente compreensíveis os sentimentos que tudo isso desperta em uma criança, ser ainda em formação, aprendendo a entender e a lidar com tudo o que vivencia. Sentimentos que deveriam ser acolhidos, respeitados e compreendidos, ao invés de simplesmente ignorados em nome da suposta ‘boa educação feita de limites e disciplina para não criar pequenos tiranos’.

Ninguém se torna um futuro tirano por ter suas tristezas acolhidas. Ninguém se torna uma criança mimada porque seu choro foi ouvido, ao invés de silenciado. Nenhuma criança crescerá indisciplinada ou insuportável porque seus sentimentos foram respeitados, porque sua voz foi ouvida.
Eu diria que a palavra chave para criar filhos emocionalmente saudáveis está mais próxima de empatia, do que de disciplina e limite.

 A vida já nos cerceia bastante – a todos nós. A vida já nos traz suficientes obstáculos, que nos ensinam e ajudam a crescer. Tanto quanto aquele abraço de mãe na hora certa, tanto quanto aquele olhar de carinho sem julgamento, transbordando respeito.
Talvez, ao invés de andar por aí salpicando limites previamente determinados, baseados em conceitos engessados, no caminho de nossos filhos, devêssemos lhes estender a mão, e convidá-los para um desvendamento conjunto das ilimitadas possibilidades da vida que se renova todos os dias, feita de descoberta e aprendizado. Não seria muito, mas muito mais bonito?"


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